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Fome joga crianças para o trabalho infantil

No distrito de Cachoeirinha, zona Norte de São Paulo, rede de organizações se articula para frear crescimento de trabalho infantil em comunidades que não têm o que comer.

 Rodrigo Zavala*

O olhar atento da assistente social Ângela Assis no Jardim Peri, extremo norte da capital paulistana, identifica um grupo de crianças de pouco mais de 10 anos vendendo produtos na rua. A coordenadora do serviço do SEFRAS voltado a crianças e adolescentes nessa comunidade, com um currículo de defesa intransigente dos direitos dessa faixa-etária, sabe que elas não são as únicas, no bairro, a não ter aulas e precisar fazer bicos para ajudar suas famílias a comer.


São crianças que testemunharam a renda de suas famílias minguar com os impactos sociais da pandemia e, não sozinha, da falha sistemática e permanente na condução de políticas públicas para suas comunidades.

Elas, mais do que viverem em uma periferia, encontram-se em uma periferia existencial. Em especial, as meninas que, sem poder ir à escola ou mesmo a serviços sociais de organizações de base, ficam em casa em um cotidiano de trabalhos domésticos e cuidado dos irmãos sem descanso.

O Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil, 12 de junho, para essas realidades é apenas símbolo de uma batalha diária pelo direito das crianças. Um trabalho que Ângela Assis divide com outras 30 organizações que formam, desde 2015, o Fórum Regional de Defesa dos Direitos Humanos da Criança e do Adolescente da Cachoeirinha, distrito que congrega 24 bairros, entre eles, Jardim Peri.

Liderado pelo SEFRAS, aqui, na figura de Ângela Assis, o Fórum é composto por organizações de base, defensorias públicas, o Centro de Referência Especializado em Assistência Social e o Conselho tutelar do distrito, entre outros agentes públicos e comunitários. Todos compenetrados na missão de tornar a vida de crianças e adolescentes mais segura, protegida e com direitos à educação, saúde e desenvolvimento garantidos.

Pela página que criaram no Facebook demonstram timidamente sua luta hercúlea e cotidiana a partir de campanhas de formação e informação comunitárias, aliadas ao atendimento realizado pelas organizações sociais a crianças e suas famílias. Atendimento, este, que se tornou imprescindível durante a pandemia, visto o aumento de casos de violência doméstica, trabalho infantil, desemprego e, claro, a fome.

Nesta semana, até o dia 18 de junho, realizarão panfletagem, murais, rodas de conversa entre outras atividades para conscientizar a população. Tarefa é ainda mais difícil considerando que o trabalho infantil é naturalizado na cultura brasileira como algo positivo para a criança. Uma lógica cruel, que inibe a formação e o desenvolvimento de capacidades cognitivas, mantendo-as em um ciclo de pobreza, exclusão e violência.

É muito comum, e talvez seja a regra, que medidas necessárias à estabilidade econômica gerem mais desigualdade. Por isso, aliás, políticas públicas redistributivas são necessárias, uma das principais bandeiras de Ângela Assis. Ou, em outras palavras: “A resposta que precisamos dar às famílias é assegurar comida no prato”.

*Rodrigo Zavala é comunicador social, captador de recursos, especialista em investimento social privado. É gestor de Desenvolvimento Institucional e Sustentabilidade do SEFRAS.

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